Leilão dos Sistemas Isolados põe renováveis à prova na Amazônia

Com exigência de apenas 22% de renováveis, leilão mantém o diesel como protagonista nos sistemas isolados da Amazônia às vésperas da COP30

Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas da Ilha das Cinzas (ATAIC), primeira agroindústria operada com sistema fotovoltaico e armazenamento de energia em baterias. Foto: Ágia Drones e Imagens/ Natura/ WEG

O Ministério de Minas e Energia (MME) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) realizam, nesta sexta-feira (26/9), o Leilão dos Sistemas Isolados 2025, voltado ao fornecimento de energia para localidades no Amazonas e no Pará. O certame, que inicialmente contava com três lotes, teve a exclusão do Lote II após decisão da Comissão Permanente de Leilões da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), atendendo a um pedido do MME.

Com a mudança, 212 projetos estão cadastrados, totalizando 18,7 MW de potência requerida. Um ponto central do edital é a exigência de que ao menos 22% da energia contratada seja proveniente de fontes renováveis, percentual que deve ser comprovado anualmente pelos vencedores, sob risco de penalidades. Especialistas, no entanto, questionam se esse limite é suficiente para induzir uma transição real no contexto dos sistemas isolados.

O diesel ainda domina a matriz energética dessas regiões, respondendo por quase 70% da geração em localidades remotas. Projetos a diesel são permitidos, desde que misturem pelo menos 15% de biodiesel, enquanto usinas a biocombustíveis devem registrar a fonte renovável como principal. 

A política governamental de incentivo às renováveis enfrenta, entretanto, um dilema. Mesmo com a obrigatoriedade de 22% de participação de energia limpa, a estrutura de precificação favorece combustíveis fósseis, perpetuando a dependência de fontes poluentes.

“Ainda que o governo tenha estabelecido diretrizes para incentivar o uso de renováveis, as regras de precificação acabam favorecendo combustíveis fósseis, como o diesel, que são altamente emissores de gases de efeito estufa e poluentes locais”, afirma Rodrigo Dias, diretor de Gás e Energia da GDE Energia, do Grupo Equador.

Ele aponta que essa lógica se aplica também ao biodiesel e ao etanol, embora menos poluentes que o diesel, ambos são tratados pelo mesmo critério de precificação. “Contrariando a promessa de descarbonização na Amazônia às vésperas da COP30, o correto seria incentivar soluções como a solar com baterias, que além de mais limpas, são mais econômicas para o consumidor nos sistemas isolados”, acrescenta Dias.

O problema, segundo ele, está na metodologia de cálculo do preço do leilão. O gasto de combustível das usinas a diesel é considerado isoladamente, sem contabilizar a contribuição da energia solar em projetos híbridos. O efeito é distorcido, o diesel aparece como a opção mais barata no papel, mesmo sendo a mais poluente, limitando o avanço de alternativas limpas.

Custo de geração

Estudos recentes sobre a Amazônia Legal indicam que sistemas solares com baterias podem reduzir em cerca de 20% os custos de geração em comparação a geradores a diesel, especialmente em localidades remotas, onde a logística complexa, o transporte custoso de combustível e os riscos ambientais, como vazamentos e contaminação de rios e florestas, tornam a operação a diesel mais problemática e cara.

O Leilão dos Sistemas Isolados escancara a contradição entre o discurso de incentivo às renováveis e a prática regulatória, ainda moldada para favorecer os combustíveis fósseis. Resta a dúvida: será que metas modestas terão força para impulsionar uma transição energética consistente na Amazônia, justamente quando o mundo se mobiliza em torno de compromissos climáticos mais ambiciosos às vésperas da COP30?