Brasil investe mais em poluentes do que em proteção ambiental

Relatório da Oxfam aponta que o país destina apenas 0,34% do orçamento à gestão ambiental, enquanto financia atividades que ampliam a crise climática

Em julho de 2025, fundos IS somaram R$ 36,8 bi, alta de 89% em 12 meses. Foto: Pixabay

Um novo relatório da Oxfam Brasil revela que o país ainda falha em proteger ambiental e socialmente suas populações mais vulneráveis. O documento “Encruzilhada Climática – Um Retrato das Desigualdades Brasileiras”, lançado nesta segunda-feira (13/10), mostra que apenas 0,34% do orçamento federal em 2023 foi destinado à gestão ambiental, enquanto setores poluentes receberam investimentos muito superiores. O resultado é um modelo de financiamento climático que aprofunda desigualdades raciais, de gênero e territoriais.

Em números concretos, a disparidade é grande. A função gestão ambiental recebeu menos de R$ 1 a cada R$ 300 do orçamento federal. Por outro lado, agricultura e transporte, setores com elevado impacto sobre as emissões de carbono, receberam R$ 90,25 bilhões e R$ 43,91 bilhões, respectivamente. O Fundo Clima, principal mecanismo de fomento à mitigação e adaptação, recebeu R$ 10,4 bilhões, enquanto o Plano Safra 2024/2025 contou com R$ 400 bilhões.

“Essa escolha orçamentária revela uma prioridade perversa: privilegia setores que intensificam a crise climática em detrimento da proteção das pessoas e territórios em maior vulnerabilidade”, afirma Viviana Santiago, diretora-executiva da Oxfam Brasil.

O relatório destaca que os impactos da crise não são distribuídos de forma igualitária. Mulheres negras, populações do Norte e Nordeste e comunidades tradicionais estão entre as mais afetadas. 

No aspecto socioeconômico, mulheres negras recebem em média R$ 1.281, menos da metade do rendimento de homens brancos, que é de R$ 2.598. Regiões historicamente mais pobres concentram também os piores indicadores de saúde, educação e infraestrutura, aumentando sua vulnerabilidade a eventos climáticos extremos, como secas e enchentes.

Nas grandes cidades, favelas e periferias, onde 73% da população é negra, enfrentam falta de infraestrutura adequada para suportar chuvas intensas ou ondas de calor. “Estamos diante de um racismo ambiental evidente. A crise climática escancara e aprofunda injustiças históricas. Não haverá transição justa sem enfrentar o racismo, a desigualdade de gênero e a concentração de terras”, afirma Viviana Santiago.

O estudo também evidencia lacunas nas políticas públicas. O Estado ainda reage a desastres com créditos extraordinários, como os R$ 111,6 bilhões destinados às enchentes do Rio Grande do Sul em 2024, em vez de investir preventivamente. Apenas 12% dos R$ 185 bilhões previstos no Plano Plurianual (PPA) 2024-2027 para ações climáticas são voltados à adaptação, essencial para proteger comunidades vulneráveis.

Caminhos para uma transição justa

A Oxfam defende mudanças estruturais no financiamento climático, incluindo a incorporação de recortes de raça, gênero e território em todas as políticas; participação vinculante de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais nas decisões; direcionamento de recursos para adaptação nos territórios mais vulneráveis; e condicionamento do crédito rural à adoção de práticas sustentáveis e redução de emissões.

Segundo o relatório, sem esses ajustes, o Brasil corre o risco de ampliar desigualdades históricas e deixar grande parte da população à mercê dos impactos da crise climática.