Para zerar o rombo fiscal, governo precisa de um superavit de 4,2% do PIB, estima Sergio Vale

Pacote de corte fiscal frustrou mercado, especialmente porque, pelos cálculos do economista Sergio Vale, da MB Associados, governo precisará de um superavit primário de 4,2% do PIB (R$ 530 bilhões) em 2025 para zerar o rombo fiscal

O governo conseguiu frustrar o mercado com o pacote fiscal anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na última quarta-feira (27/12), prevendo um corte de pouco mais de R$ 70 bilhões, em dois anos, mas o desafio fiscal é muito maior e praticamente impossível, o que vai fazer com o que o dólar continue no novo patamar de R$ 6 até o fim de 2025, pelos cálculos da MB Associados.

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) só foi encaminhada para o Congresso bem tarde da noite de terça-feira (2/12), e analistas consideram o valor previsto para o ajuste muito aquém do ideal, pois o impacto previsto parece ser menor do que as estimativas do governo, variando entre R$ 40 bilhões e pouco mais de R$ 50 bilhões. Na avaliação de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, o governo ainda precisará, no próximo ano, de um superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública) de 4,2% do Produto Interno Bruto (PIB) para conseguir estabilizar o crescimento do endividamento do governo, ou seja, R$ 530 bilhões. Considerando a estimativa dele para o PIB de 2025, em torno de R$ 12,6 trilhões.

Vale lembrar que, conforme os dados do Banco Central, em outubro, da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG), que abrange governo federal, Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e governos estaduais e municipais, chegou a R$ 9 trilhões, o equivalente a 78,6% do — aumento de 0,4 pontoo percentual do PIB em relação ao mês anterior –, em grande parte, devido ao aumento dos juros e da desvalorização cambial.

De acordo com o economista, mesmo com os ajustes previstos no pacote, talvez eles sejam sufiicientes apenas para chegar a meta fiscal atual de deficit primário zerado no que vem, e de superavit de 0,5% do PIB em 2026. “Este é quase inalcançável dado o fato de ser um ano eleitoral. O problema é que isso está muito longe de ser suficiente. Considerando uma taxa real de juros (acima da inflação) de 7%, crescimento do PIB de 1,8% e dívida pública bruta em 80%, números estimados para 2025 pela MB”, explicou.  “Com isso, estamos quase cinco pontos percentuais do que seria necessário para estabilizar a dívida pública, dado um deficit primário de quase 0,8% do PIB em 2025”, acrescentou Vale.

Logo, de acordo com o economista da MB, dos R$ 71,9 bilhões estimados pelo governo de economia entre 2025 e 2026, “boa parte será difícil de atingir”. Pelas contas dele, na pior das hipóteses, o governo deixará de ganhar cerca de R$ 30 bilhões desse total estimado e, na melhor, em torno de R$ 20 bilhões. 

“O pacote foi vendido de início como ambicioso, mas se mostrou muito frágil na divulgação final. Foram poucas medidas relevantes e estruturais, além de uma ampliação da ideia de combater fraudes nos programas sociais. A discussão em torno do abono salarial, que parecia promissora, mostrou-se, talvez, a pior de todas as medidas”, afirmou. 

Novas projeções

Após os dados do PIB do terceiro trimestre, Sergio Vale revisou de 2,8% para 3,4% a previsão de crescimento do PIB deste ano. E, para 2025, ele manteve a estimativa de expansão da atividade econômica, de 1,8%. 

“Será difícil para o país repetir o crescimento de 2024 em 2025. Esperamos 1,8% de expansão ano que vem, com a inversão do que vimos este ano: as commodities devem ter desempenho melhor do que a indústria e os serviços. Vale dizer que 1,8% pode se tornar um teto pelo impacto negativo do que o governo está construindo neste momento”, alertou.  

Vale manteve as projeções para a inflação deste ano e do próximo em 4,7% e 4%, respectivamente, mas piorou as estimativas para o câmbio e a taxa básica da economia (Selic), atualmente em 11,25% ao ano. 

O dólar, que vem disparando após o aumento da desconfiança do mercado em relação à capacidade do governo em conseguir equilibrar as contas públicas, deverá encerrar este ano e o próximo cotado em R$ 6 pelas novas estimativas da MB. Já a Selic deverá encerrar 2024 em 12% ao ano — o que implica em um aumento de 0,75 ponto percentual na taxa básica na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) da próxima semana. E, para o fim de 2025, Vale prevê os juros fechando dezembro em13% anuais. Antes, as projeções para a Selic estavam 11,75%, no fim deste ano, e, em 10,50%, no fim de 2025. Não à toa, a previsão para a dívida pública bruta no fim de 2025 também piorou, passando de 81,9% para 83% do PIB.