Oito organizações da sociedade civil enviaram ofício ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) solicitando que ele vete a criação da licença-compensatória no Tribunal de Contas da União (TCU). O penduricalho está previsto em um dispositivo do Projeto de Lei (PL) n.º 2.829/2025, que trata da reestruturação das carreiras do órgão, aprovado pelo Congresso no último dia 3.
A medida deve aumentar em 56% a remuneração atual dos servidores da Corte de Contas, para R$ 58,6 mil, até 2029 — valor acima do teto constitucional, de R$ 46,3 mil –, ou até mais do que isso em alguns casos. De acordo com as entidades, o artigo 17 do PL concede dias de folga aos servidores em exercício de funções relevantes e com acúmulo de atividades, que podem ser convertidas em pagamento.
Segundo as entidades, a sanção integral do PL servirá de “precedente legal e incentivo para que outros órgãos e poderes busquem instituir ou consolidar” a licença-compensatória. O ofício alertou que a sanção integral do projeto institucionalizará um penduricalho concedido com baixa transparência e elevado impacto aos cofres públicos.
A licença-compensatória, atualmente, não está prevista em lei federal, apesar de ser implementada por diversos órgãos. Só o Judiciário pagou, em 2024, ao menos R$ 1,2 bilhão com o penduricalho a 10,7 mil magistrados, conforme estudo da Transparência Brasil e do República.org.
“A sanção do projeto, assim, amplia sobremaneira o risco fiscal e gerencial, pela sua potencial replicabilidade. Institucionaliza-se um adicional ao contracheque sem contrapartida de melhora de produtividade, que poderá ser acionado continuamente pelos servidores elegíveis, dependendo apenas da disponibilidade orçamentária do órgão”, alertou o documento de quatro páginas enviado ao presidente Lula ao qual o Blog teve acesso. “Tal característica agrava a inflexibilidade do gasto público, dificultando o planejamento fiscal de médio e longo prazo, e contraria o esforço nacional de controle de despesas obrigatórias com pessoal”, acrescentou o texto.
As organizações afirmam ainda que o veto integral ao artigo 17 do PL “garante a prevalência do interesse público e evita a permissão de um benefício custoso aos cofres públicos, em acordo com o esforço nacional de controle de despesas obrigatórias com pessoal, sem afetar os demais dispositivos do projeto”.
Assinam o ofício as entidades: Transparência Brasil, Associação Fiquem Sabendo, Centro de Liderança Pública (CLP), Movimento Pessoas à Frente, Livres, República.org, Plataforma JUSTA e Transparência Internacional – Brasil.
“A licença-compensatória é um dos penduricalhos mais danosos da atualidade, elevando os salários em até um terço sem qualquer controle do teto constitucional. Verificamos com extrema preocupação o seu alastramento pelo serviço público, inclusive nos subnacionais”, disse Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil, no comunicado.
Na avaliação de Fernanda Melo, da República.org, o PL 2829/2025 representa mais um movimento de categorias de elite do funcionalismo que competem por privilégios financiados pelo contribuinte e assim ampliam desigualdades – dentro e fora do funcionalismo. “A aprovação desse projeto de lei é didática em relação à corrida por privilégios. Sob o falso argumento da isonomia, o PL amplia distorções e iniquidades no sistema remuneratório do serviço público. São benefícios para uma minoria ínfima do funcionalismo, mas que impactam a confiança pública no Estado e na capacidade dessas carreiras em exercerem as suas funções com ética e isenção”, ressaltou.