Após as falas desastrosas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que ajudaram a pressionar o câmbio, levando o dólar para mais de R$ 5,70, nesta semana, o governo resolveu mudar a comunicação e dar alguma sinalização de corte de gastos para tentar acalmar os ânimos dos agentes financeiros — que são os maiores credores da dívida pública. Essa mudança no discurso, no entanto, não adia o inevitável descumprimento da meta fiscal deste ano, pois o rombo das contas públicas segue crescendo e deve superar o limite de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB) e ainda muitas dúvidas se ela não vai ser alterada novamente.
Após reunião com o chefe do Executivo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse, ontem, que Lula autorizou corte no Orçamento de 2025 e, além disso, que ele continua comprometido com o novo arcabouço fiscal. Mas ainda não está claro se o governo conseguirá cumprir a meta fiscal sem ter que mudá-la novamente até o fim do ano. Além disso, o corte de R$ 25,9 bilhões de despesas obrigatórias anunciado, ontem, por Haddad está previsto apenas no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (Ploa) de 2025, que será apresentado no fim de agosto ao Congresso Nacional.
Antes do anúncio, o dólar apresentou uma leve queda, em grande parte, devido ao feriado norte-americano da Independência dos Estados Unidos, desta quarta-feira (4/7), do que pelo fato de Lula evitar fazer qualquer nova crítica ao Banco Central e ao seu presidente, Roberto Campos Neto. Com as bolsas dos Estados Unidos fechadas, hoje, a divisa norte-americana segue recuando e, nesta manhã, estava sendo negociada abaixo de R$ 5,50. Contudo, a expectativa é de que a volatilidade seguirá elevada ao longo do ano, a depender das falas do chefe do Executivo, em grande parte.
“A queda do dólar tem a ver também com essa sensação de trégua que o governo deu em relação ao fiscal. A anuência do presidente em relação ao arcabouço fiscal dá um período de paz. Mas vamos precisar esperar o relatório bimestral de receitas e despesas (no próximo dia 22) e os detalhes do Ploa, em agosto, para sabermos exatamente o que o governo está pensando em termos de contingenciamento e corte de gastos em 2025. A incerteza ainda permanece”, destacou Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, ao Blog.
Na avaliação de Vale, o corte de despesas no Orçamento do próximo ano anunciado por Haddad será pequeno e “não vai ao cerne da questão e deixa uma solução de curto prazo que não está clara como será feita”. “A acomodação da fala do presidente, em si, é positiva, mas o fato de que o fiscal segue sem uma solução adequada de longo prazo permanece”, afirmou o economista. “Vamos ter que esperar 2027 para um novo regime fiscal mais crível do que o atual”, acrescentou.
Pelas projeções da MB, o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano deverá crescer 2,2% e a mas com rombo fiscal, que chegará a 0,8% do PIB. E, com isso, a dívida pública bruta continuará crescendo, rumo a patamares muito elevados para um país emergente como o Brasil, passando de 74,3% do PIB, em 2023, para 78,3%, do PIB, em 2024. “Dada a piora nos gastos, ainda segue sendo verdade que, para entregar um deficit programado menor de 0,25% do PIB, em vez de 1% do PIB, a necessidade de arrecadação a mais desde o ano passado era de R$ 350 bilhões, dos quais o governo deve conseguir em torno de R$ 150 bilhões, segundo cálculos do Instituto Fiscal Independente (IFI)”, destacou Vale em relatório divulgado aos clientes da MB.
Segundo ele, parte do ajuste faltante de R$ 250 bilhões teria que vir de uma combinação mais agressiva de diminuição de gastos tributários e ajuste no no ritmo de crescimento dos gastos (não se fala aqui em corte, mas cresce em ritmo menor). “Como se sabe, ajustar o crescimento dos gastos de saúde e educação dentro da margem de expansão de 2,5% ao ano e desvincular o salário mínimo da Previdência Social seria essencial para ser o início de um encaminhamento. Entretanto, as falas do presidente, insistentemente, têm sido no sentido contrário e colocam a equipe econômica em situação ainda mais fragilizada”, acrescentou o economista.