Dólar mais forte e fiscal fraco fazem mercado apostar em taxa Selic acima de 16%

Mesmo com leilão extraordinário do Banco Central, dólar segue acima de R$ 6, sinalizando um novo patamar para o câmbio. Com isso, algumas apostas para a Selic superam 16%, segundo analistas

This ilustration shows a man counting US dollars in Caracas on January 28, 2019. Venezuela devalued its currency by almost 35 percent on Monday to bring it into line with the exchange rate of the dollar on the black market. The exchange rate is now fixed at 3,200 bolivars to the dollar, almost matching the 3,118.62 offered on the dolartoday.com site that acts as the reference for the black market. / AFP / YURI CORTEZ

A mediana das estimativas dos economistas do mercado para a taxa básica da economia (Selic) coletadas pelo Banco Central no relatório Focus segue sendo revisada para cima, e, nas projeções para os juros futuros. Mesmo com o BC anunciando mais uma intervenção extraordinária no câmbio, o dólar segue valorizado em um novo patamar, diante de um quadro fiscal incerto.

As novas projeções do mercado para a taxa básica da economia (Selic) sinalizam que ela poderá ficar acima de 16% ao ano, em 2025, devido ao maior esforço da política monetária para que a inflação retorne para o centro da meta, de 3%, na primeira metade de 2026, segundo analistas.

Nesta segunda-feira (16/12), o BC realizou um leilão extraordinário de dólares, injetando US$ 1,6 bilhão – a maior venda à vista em pouco mais de quatro anos —  e ainda realizou uma oferta de US$ 3 bilhões em leilão de linha — modalidade com compromisso de recompra anunciada na sexta-feira passada, quando vendeu US$ 845 milhões de dólares em um leilão à vista, um dia após a venda US$ 4 bilhões em dois leilões de linha. Apesar da nova intervenção inesperada, a divisa norte-americana continuou sendo negociada acima de R$ 6, com alta de 0,36%, no início da tarde de hoje.

“Tudo indica que o dólar atingiu um novo patamar e, provavelmente, deverá ficar em torno de R$ 6 por um período mais prolongado”, afirma Fernando Honorato, diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco. Os economistas do banco liderados por ele estão debruçados sobre as planilhas refazendo as projeções macroeconômicas.

A mediana das projeções para o dólar neste ano passaram de R$ 5,95 para R$ 5,99, entre o boletim Focus da semana passada e o desta semana, e, para os anos seguintes, o novo piso dessa moeda passou para R$ 5,70. Em 2025, a previsão para a divisa norte-americana no fim do ano passou de R$ 5,77 para R$ 5,85. As estimativas para o resultado primário das contas públicas seguem no vermelho até 2027 e rompendo o piso inferior da meta fiscal, que permite um rombo de até 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB).

Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, lembrou ainda que o dólar segue valorizado por conta da expectativa do mercado com a reunião do comitê de política monetária do Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos), que começa amanhã e termina na quarta-feira. “O dólar está mais forte no mundo hoje, com investidores aguardando o Fed. O banco central dos EUA deve revisar para cima as projeções de juros adiante, o que impacta o nosso câmbio também”, explicou.

De acordo com Cruz, as falas do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre o Brasil, afirmando que aqui se taxa demais, pode sinalizar que o país também pode ser alvo do republicano. Ele lembrou que a taxa de juros para os contratos futuros com vencimento em 2027 está em 15,4% ao ano.

Na semana passada, o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a Selic em 100 pontos-base, elevando-a para 12,25% ao ano, e informou que haverá mais duas altas da mesma magnitude. Isso indica que a taxa básica deverá subir para 14,25% ao ano, até março de 2025, o que impactou nas projeções para a Selic nos próximos anos. A mediana das projeções do mercado passou de 13,50% para 14% ao ano no fim de 2025 e, pelas novas estimativas, os juros básicos seguirão acima de 10% até dezembro de 2027. Para 2026, por exemplo, as perspectivas para a Selic no fim do exercício subiu de 11% para 11,25% anuais. 

Pelas novas perspectivas da Tendências Consultoria, as probabilidades de concretização dos cenários pessimista e básico passaram para 30% e 60%, respectivamente. Em ambos os cenários, as estimativas indicam piora no quadro fiscal. Pelas estimativas da consultoria, no cenário pessimista, por exemplo, a taxa Selic ficará acima de 12% ao ano até 2034.

Inflação em alta

Apesar do choque de juros prometido pelo Banco Central, as expectativas de inflação seguem acima do teto da meta, de 4,50%, neste ano e em 2025, em grande parte, devido à valorização do dólar, que deverá continuar em patamar elevado, em grande parte, devido à piora do quadro fiscal e também pelo retorno de Donald Trump à Casa Branca no próximo ano.

A mediana das estimativas no Focus para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2024, subiu de 4,84% para 4,89%. E, para o fim de 2025, a mediana das estimativas para o IPCA passou de 4,59% para 4,60%. Além disso, o mercado continua projetando a inflação acima do centro da meta, de 3%, até 2027. 

Já a mediana das estimativas para o crescimento do PIB brasileiro em 2024 subiu de 3,39% para 3,42% – quarta alta consecutiva no boletim Focus. Um mês antes, a projeção era de 3,10%. Considerando as 31 previsões atualizadas nos últimos cinco dias úteis, a projeção de do mercado passou de 3,44% para 3,49%. 

Nos anos seguintes, as perspectivas são de desaceleração da atividade econômica, com o PIB crescendo em torno de 2% até 2027.