A semana começa com uma notícia nada positiva para as contas públicas, com a dívida pública bruta do Brasil está cada vez mais perto de 80% do Produto Interno Bruto (PIB) — patamar considerado insustentável para países emergentes e com taxas básicas de juros de dois dígitos. Conforme dados do Banco Central, divulgados nesta segunda-feira (29/7), a dívida pública bruta passou de 76,7% do PIB, em maio, para 77,8% do PIB, em junho, atingindo o maior patamar desde novembro de 2021.
Na comparação mensal, a Dívida Pública do Governo Geral (DBGG) em relação ao PIB registrou aumento de 1,1 ponto percentual. Em valores nominais, a DBGG somou R$ 8,691 trilhões, em junho, valor ampliado em R$ 612,2 bilhões na comparação com dezembro de 2023 e o equivalente a 5,5% do PIB de crescimento. O PIB nominal estimado pelo BC para este ano é de R$ 11,166 trilhões.
A taxa da dívida pública bruta em relação ao PIB é um dos principais termômetros globais da capacidade de um país honrar seus compromissos e ela segue crescendo devido ao aumento dos gastos do governo em ritmo muito mais acelerado do que a arrecadação, que resulta em rombos fiscais.
A taxa básica da economia (Selic), atualmente, está em 10,50% ao ano, abaixo dos 11,75% de dezembro do ano passado. Conforme dados do BC, cada ponto a menos da Selic implica em R$ 46,4 bilhões a menos na DBGG e, mesmo assim, a dívida pública segue crescendo, em grande parte, devido ao aumento do prêmio de risco exigido pelos credores dos títulos públicos em meio à piora do quadro das contas públicas.
“O aumento persistente da dívida pública bruta nos últimos meses não é surpresa, pois estamos convivendo ainda com deficit fiscal distante da meta (de deficit primário zerado com limite de até 0,25% do PIB) e também com gastos públicos crescendo a uma taxa superior ao crescimento real da economia”, alertou Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos. “Além disso, com estamos com uma inflação esperada superior à meta central, o Bacen teve que manter um aperto monetário pelos juros e isso, claro, refletiu em custo maior na colocação da dívida pública”, acrescentou.
De acordo com Velho, como a perspectiva do mercado ainda é de deficit nas contas públicas, em 2024 e em 2025, e com uma taxa real de crescimento do PIB não muito superior à faixa de 2% a 2,5% , “a tendência é de que a dívida pública supere 80% do PIB nos próximos meses”.
Discurso de Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – após fazer várias críticas ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que mexeram com o mercado e fizeram o dólar ganhar um novo patamar, acima de R$ 5,60 – resolveu fazer um pronunciamento em rede nacional no último domingo de que é responsável fiscalmente, mas não convenceu muito o mercado, segundo analistas.
“Não abrirei mão da responsabilidade fiscal. Entre as muitas lições de vida que recebi de minha mãe, dona Lindu, aprendi a não gastar mais do que ganho. É essa responsabilidade que está nos permitindo ajudar a população do Rio Grande do Sul com recursos federais”, disse o chefe do Executivo. “Aprovamos uma reforma tributária que vai descomplicar a economia e reduzir o preço dos alimentos e produtos essenciais, inclusive a carne”, acrescentou o petista.
A fala do presidente Lula ocorreu poucos dias antes do início de mais uma reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), do BC, que começa amanhã e termina na quarta-feira.
Aliás, nesta semana, teremos mais uma “super-quarta”, quando a reunião do Copom coincide com a do Fomc, o comitê de política monetária do banco central dos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed). As apostas dos analistas são de manutenção nas taxas básicas de juros em ambas as decisões e a expectativa é que o comunicado do BC seja mais duro do que o anterior, de junho, quando houve consenso entre os diretores da autoridade monetária sobre a manutenção da Selic em 10,50% ao ano.
Piora do quadro fiscal
Além do aumento da dívida pública bruta, os dados fiscais divulgados, hoje, pelo Banco Central não são muito animadores, de acordo com analistas, pois o setor público consolidado – que reúne os governos federal e regionais e as estatais federais – registrou um deficit primário de R$ 40,9 bilhões em junho – maior do que o esperado pelo mercado.
O banco Itaú Unibanco, por exemplo, esperava rombo de R$ 34,7 bilhões, para o setor público consolidado. E, para o governo central – que inclui Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central –, a previsão era de um saldo negativo de R$ 35,7 bilhões, mas o dado também foi pior: de um deficit de R$ 38,8 bilhões.
De acordo com dados do BC, o deficit nominal do setor público consolidado – que inclui o resultado primário e os juros nominais apropriados e mostra a necessidade de financiamento do país – foi deficitário em R$ 135,7 bilhões em junho. No acumulado em 12 meses, até o mês passado, o deficit nominal alcançou R$ 1,108 trilhão, o equivalente a 9,92% do PIB, acima dos 9,56% do PIB no acumulado até maio.
“A arrecadação (do governo federal) tem se mostrado mais forte no primeiro semestre, mas os riscos fiscais continuam elevados, considerando o crescimento de gastos obrigatórios acima do limite definido no arcabouço fiscal e a dificuldade em obter uma trajetória de convergência de resultados primários”, disse o economista Thales Guimarães, do Itaú Unibanco, em relatório aos clientes da instituição financeira.
O economista reforçou o alerta do mercado de que a contenção de R$ 15 bilhões de gastos, anunciada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na semana passada, ainda é insuficiente para o cumprimento da meta de resultado primário e de limite de gastos. Contudo, na avaliação dele, a medida foi “importante instrumento de sinalização da disposição do governo em cumprir o arcabouço fiscal”. “À frente, será importante monitorar medidas adicionais de controle de gastos visando não só 2024, mas também 2025, que serão fundamentais para evitar um novo dano de credibilidade ao plano fiscal do governo após a mudança recente das metas de primário de 2025 em diante”, acrescentou o analista.