BC sinaliza alta de juros em maio e apostas indicam Selic chegando a 15% ou até 15,50%

BC deixa porta aberta para nova alta na próxima reunião, mas "de menor magnitude". Maioria de analistas consideram outro aumento dos juros em junho, elevando a Selic para algo entre 15% e 15,50% anuais, antes do fim do ciclo

Crédito: Raphael Ribeiro/ Banco Central

O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, foi coerente com os comunicados anteriores e decidiu, na quarta-feira (19/3), aumentar a taxa básica da economia (Selic) em mais 1,0 ponto percentual, conforme o esperado pelo mercado, para 14,25% ao ano para os próximos 45 dias – maior patamar desde outubro de 2016, no governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

Segundo o comunicado divulgado do Copom, o ciclo de alta dos juros, iniciado em setembro de 2024, não terminou e, portanto, haverá mais uma um aumento de “menor magnitude” no próximo encontro, nos dias 6 e 7 de maio. “Diante da continuidade do cenário adverso para a convergência da inflação, da elevada incerteza e das defasagens inerentes ao ciclo de aperto monetário em curso, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, um ajuste de menor magnitude na próxima reunião”, destacou a nota divulgada após o segundo dia de reunião do Copom.

O BC, contudo, não deu sinalização para as reuniões seguintes, mas reafirmou que “a magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditado pelo compromisso de convergência da inflação à meta e, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica”. Na avaliação de analistas, em meio à aceleração da inflação que vem rodando acima de 5% no acumulado de 12 meses — acima do teto da meta, de 4,50% — haverá, pelo menos, mais uma alta de juros em junho, antes do fim do ciclo de aperto monetário. As projeções para a Selic terminal desse processo variam entre 15% e 15,50% ao ano. 

Unanimidade e que no ranking global de juros reais

A decisão do Copom foi unânime entre os nove integrantes da diretoria, incluindo o presidente do BC, Gabriel Galípolo, que lidera o grupo com mais seis diretores indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em meio à queda da popularidade de Lula e, também do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o petista tem anunciado medidas de estímulo fiscal e de consumo —, como o crédito consignado e a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil — que tendem a pressionar ainda mais a inflação que está rodando acima de 5% no acumulado em 12 meses.

E, mesmo com a quinta alta da Selic consecutiva, o Brasil caiu da 2ª para a 4ª colocação em um ranking global de juros reais (descontada a inflação), abaixo de Turquia, Argentina e Rússia, conforme levantamento da MoneYou e da Lev Intelligence com as 40 principais economias. (Ver quadro). A média dos juros reais ficou em 1,70% e, de acordo com Jason Vieira, economista responsável pelo levantamento, o movimento global de políticas de aperto monetário perdeu força, sendo o contexto majoritário de manutenção das taxas, como aconteceu com o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos), em mais uma “superquarta”.

O Fomc, comitê de política monetária do Fed, decidiu, ontem, manter os juros básicos entre 4,25% e 4,50% ao ano, após elevar as projeções para a inflação. Já o Copom fez pequenos ajustes na projeção para a inflação oficial deste ano, que fica acima do teto da meta, passando de 5,2% para 5,1%. E, para o terceiro trimestre de 2026, considerado o horizonte relevante para o qual o BC tem monitorado, a previsão do BC para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) passou de 4,0% para 3,9% – abaixo do teto, mas superior ao centro da meta, de 3%.

Cenário desafiador, mas risco fiscal atenuado

No comunicado da segunda reunião do ano do Copom, divulgado, o colegiado reconheceu que o ambiente externo permanece desafiador “em função da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos, principalmente pela incerteza acerca de sua política comercial e de seus efeitos”. Contudo, atenuou os alertas sobre que piora do quadro fiscal e a necessidade da busca do equilíbrio das contas públicas, citando que “o Comitê segue acompanhando com atenção como os desenvolvimentos da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros”.

Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, por exemplo, manteve a previsão de duas altas da Selic, sendo de 0,50 ponto percentual, em maio, e de 0,25 ponto percentual, em junho –, o que elevará a Selic para 15% ao ano, patamar que será mantido até dezembro.  “O comunicado sinaliza mais uma alta adicional em ritmo menor (em maio) e a justificativa dessa postura é a preocupação com a não convergência das expectativas de inflação. Nas nossas projeções, há espaço para mais duas altas além das sinalizadas (em dezembro), alcançando uma taxa básica de 15% até o fim do ano e a decisão de hoje não altera esse nosso cenário. Mas, claramente, o viés é para juros mais elevados”, afirmou. 

Luis Otavio de Souza Leal, economista-chefe da G5 Parterner, considerou que o comunicado do Copom “trouxe algumas mudanças interessantes para o cenário prospectivo da política monetária brasileira, como o reconhecimento de que a atividade econômica pode estar desacelerando e a sinalização de mais uma elevação da taxa Selic”. Para ele, o comunicado continuou sendo duro, “porque considera o quadro ainda bastante desafiador para a inflação e a ausência de convicção sobre o panorama da atividade econômica”. Ele projeta uma alta de 0,75 ponto percentual na Selic na reunião de maio, o que elevaria os juros básicos para 15% ao ano, encerrando o ciclo de aperto monetário ” A parte do comunicado que reforça a defasagem dos efeitos da política monetária restritiva joga a favor dessa percepção de que estamos próximos do fim do ciclo”, frisou.

De acordo com Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, o comunicado do Copom “manteve um tom vigilante” ao reconhecer que as expectativas de inflação seguem desancoradas com resiliência na atividade econômica, além de concluir que o cenário “exige uma política monetária mais contracionista”.  Segundo ele, o BC ainda tem muito trabalho para conseguir entregar a inflação na meta e, para isso, “uma taxa Selic mais alta que o nível atual (de 15% ao ano, pela mediana das projeções do mercado) não é suficiente, e a política monetária precisará de mais esforço para atingir seu objetivo”. 

Ao ver de Megale, dado o cenário desafiador descrito no comunicado do Copom, a decisão e o comunicado são consistentes com a atual projeção da XP que prevê uma Selic terminal de 15,50% no primeiro semestre, com altas de 0,75 ponto percentual,  em maio, e de 0,50 ponto, em junho.  Rafael Cardoso, economista-chefe do Banco Daycoval, também avaliou que a decisão foi “completamente esperada”, porque havia a sinalização de Galípolo de que a barra era muito alta, para se alterar qualquer decisão. Ele também prevê mais duas altas até o fim do ciclo de aperto monetário, com a Selic terminando em 15,25% anuais. 

O economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-diretor do BC e consultor externo da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), avaliou que o comunicado do Copom foi mais “dovish” — termo que significa mais tolerante com a inflação –, refletindo a mudança na gestão da autoridade monetária com Galípolo, que foi indicado por Lula e, por conta disso, no máximo, os juros deverão subir até 15,50% nesse ciclo. “O BC não vai buscar mais a meta de inflação, porque isso exigiria uma Selic de 16% ou mais. Ele está, agora, mais preocupado com a atividade econômica. Na gestão anterior, a preocupação principal era inflação”, afirmou. 

Preocupação do setor produtivo

E, apesar de o presidente Lula – que tem feito vários anúncios recentes de estímulos fiscais que terão impacto inflacionário, como o do consignado e da isenção do Imposto de Renda  – e integrantes do governo evitarem fazer críticas à decisão do BC, como ocorria na gestão de Roberto Campos Neto, entidades patronais voltaram a fazer alerta sobre os riscos dos juros cada vez mais altos para a atividade produtiva. A Confederação Nacional da Indústria (CNI), afirmou que a decisão do Copom foi “um erro” e que o aumento da Selic “não é necessário para controlar a inflação e prejudicará o ritmo de crescimento da economia”.  A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), por sua vez, afirmou que com a decisão do Copom “torna o cenário ainda mais desafiador para setores estratégicos da economia, como a indústria, cuja produção segue 16% abaixo de sua máxima histórica”, além de penalizar o país que “carece de condições básicas para alcançar seu potencial econômico”.

O Conselho Regional de Economia da 2ª Região-SP (Corecon-SP) criticou a decisão do Copom, em carta aberta, chamando a atenção para os limites do uso da taxa Selic para o controle da inflação. “Um dos efeitos negativos de uma taxa Selic muito elevada é o impacto sobre a trajetória da dívida pública, uma vez que as expressivas despesas com juros têm sido o principal fator a impulsionar o aumento do endividamento e a deterioração da percepção sobre o risco fiscal. Em 2024, os gastos com juros atingiram R$ 950 bilhões, contribuindo para um deficit nominal de R$ 998 bilhões”, destacou o documento. A entidade lembrou que, no ano passado, foram gastos R$ 193 bilhões em Saúde, e outros R$ 137 bilhões, em Educação.