Nota técnica de economistas do Banco Mundial elogia a iniciativa do Imposto Seletivo sobre produtos prejudiciais à saúde, previsto na regulamentação da reforma tributária que ainda está em curso no Congresso Nacional. Contudo, faz um alerta sobre os riscos de o imposto cobrado no final acabar ficando menor do que a tributação atual diante.
De acordo com eles, é preciso que os parlamentares que estão cuidando da regulamentação da reforma fiquem atentos se esse Imposto Seletivo fique acima das alíquotas atuais do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) sobre alguns produtos nocivos à saúde, como bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas e cigarros. Assim, esse Imposto Seletivo cumprirá a função de inibir o consumo, além de preservar a saúde e o meio ambiente efetivamente, pois a tributação mais elevada afetará o preço dos produtos e, assim, ajudará a beneficiar as famílias mais pobres.
“As alíquotas dos impostos precisam ser maiores do que as atuais, especialmente para inibir o consumo e, assim, ter um impacto mais positivo, tanto na economia, quanto na saúde da população”, orienta o economista sênior do Banco Mundial Cornelius Fleischhacker, um dos autores da nota técnica “Analisando impostos de saúde”. “Hoje, a tributação sobre o cigarro e a bebida alcoólica é muito confusa e a reforma precisa deixar esse sistema mais organizado. E, com isso, o Imposto Seletivo também deve evitar que a tributação efetiva do IPI sobre esses produtos produtos diminua”, alerta o analista.
O estudo de 28 páginas, divulgado na noite desta quarta-feira (23/10), busca responder algumas perguntas específicas sobre impostos de saúde e questões-chave levantadas durante as reformas de impostos de saúde, com base nas melhores práticas globais, evidências científicas e a experiência do Banco Mundial em trabalhar com países no design e implementação de reformas de impostos de saúde. “O Brasil tem uma oportunidade valiosa de melhorar a saúde pública e os resultados econômicos por meio de tributação estratégica, e é crucial aproveitá-la. A implementação de impostos de saúde bem projetados salvará inúmeras vidas, aumentará o capital humano e aumentará a produtividade da economia”, destaca o analista.
Conforme dados do levantamento, os impostos e preços de produtos de tabaco, bebidas alcoólicas e bebidas açucaradas no Brasil são baixos em comparação aos observados em países pares da América Latina e do G20 — grupo das 19 maiores economias desenvolvidas e emergentes do planeta mais a União Europeia. Na avaliação do economista, a reforma tributária, assim como a proposta do Imposto Seletivo sobre tabaco, álcool e bebidas açucaradas, se forem bem implementados, podem aumentar a eficácia dos tributos no sentido de melhorar a saúde da população e a arrecadação adicional de impostos.
“Há evidências globais robustas em apoio a esse tipo de reforma, o que justifica a adoção de tributos bem concebidos e administrados na área da saúde. Com base em boas práticas globais, recomenda-se que os impostos de saúde se concentrem em impostos específicos ou, quando aplicados em sistemas mistos, que os impostos específicos componham uma parte maior do Imposto Seletivo que o componente ad valorem”, informa o relatório.
De acordo com o Banco Mundial, o Imposto Seletivo, atualmente em discussão no Senado e na lei ordinária que deve ser apresentada ao congresso em 2025, pode ser uma oportunidade de o governo taxar de forma mais incisiva esses produtos que são prejudiciais à saúde da população. Segundo a nota, elaborada pelos economistas do Banco Mundial, é necessário aprimorar a capacidade de administração tributária para garantir a devida aplicação e conformidade dos avanços na implementação da tributação sobre esses produtos que são prejudiciais à saúde.
Conforme dados do Banco Mundial, todos os anos, aproximadamente 341 mil mortes no Brasil, representando cerca de 20% de todas as mortes, são atribuíveis ao consumo de tabaco, álcool e bebidas açucaradas. “Esses produtos são os que mais contribuem para doenças cardiovasculares, câncer, diabetes e enfermidades pulmonares crônicas. A implementação de impostos especiais sobre esses produtos nocivos é uma estratégia comprovada para deter e reduzir seu consumo”, destaca Fleischhacker.
De acordo com a nota técnica, baseada em dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), no Brasil, mais de 20% das mortes anuais têm relação com o consumo de tabaco, bebidas alcoólicas e bebidas açucaradas. Atualmente, 10% dos brasileiros adultos fumam diariamente e 58,1% consomem bebidas alcoólicas; e 8%, bebidas alcoólicas em grande quantidade. Desses hábitos, o tabagismo é o que causa mais danos, com 2,5 vezes mais mortes que o consumo de álcool no país.
As recomendações da nota de política pública do Banco Mundial visam a promover benefícios substanciais para a saúde pública e aumentar as receitas tributárias. “Do ponto de vista da saúde, a redução do consumo desses produtos levará a uma diminuição significativa das mortes e doenças evitáveis. Apesar do declínio previsto no consumo, o país ainda poderá arrecadar maiores receitas fiscais com esses impostos. As famílias mais pobres deverão ser as mais beneficiadas com a política, pois as populações de baixa renda são mais sensíveis às mudanças de preços. Um aumento significativo de preços impulsionado pela implementação de impostos de saúde bem planejados reduzirá substancialmente o consumo de tais produtos entre esse grupo”, informa o estudo.
A nota apresenta formas de taxar tabaco, álcool e bebidas açucaradas de modo a reduzir a mortalidade da população e melhorar as receitas tributárias. No caso do tabaco, um sistema misto proposto está alinhado a boas práticas globais; no entanto, serão necessários aumentos significativos nos impostos para garantir a eficácia do modelo atual e alcançar resultados positivos em relação à saúde e às receitas.
No caso do álcool, um sistema misto proposto também se encontra alinhado a boas práticas globais; no entanto, a base de cálculo para o componente ad valorem proposta para ser aplicada no início da cadeia de suprimentos não terá um impacto significativo nos preços e não alcançará os resultados pretendidos. Recomenda-se que a base de cálculo seja aplicada numa etapa posterior da cadeia de suprimentos (ou seja, nos preços de varejo) para garantir um impacto maior na área de saúde. E, por fim, no caso das bebidas açucaradas, os impostos devem ser aplicados de forma ampla a todas as bebidas açucaradas (inclusive sucos de frutas, leite adoçado com açúcar e todas as categorias de bebidas que usam açúcar como adoçante) e devem excluir alternativas mais saudáveis (por exemplo, água e leite). Isso alcançará o impacto desejado na saúde ao incentivar a substituição por produtos mais saudáveis.
A nota técnica também tem como objetivo conscientizar os legisladores da importância do Imposto Seletivo sobre os produtos que são prejudiciais à saúde, segundo o economista do Banco Mundial. Ele, inclusive, disse que poderá comparecer ao Congresso para explicar os dados do levantamento e as comparações das tributações em outros países.