Apesar de estar com pressa para aprovar o quanto antes do recesso parlamentar, que deverá começar antes do Natal, o pacote de cortes de gastos anunciado na última quarta-feira (27/11), o governo federa ainda não enviou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com as medidas previstas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e que teriam um impacto em torno de R$ 70 bilhões no Orçamento de 2025 e 2026.
“O atraso no envio da PEC é naturalmente relevante para os itens que precisam ser endereçados ainda esse ano. Em particular, a prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU), que tem validade até o fim de 2024. Também destacaria a mudança na complementação da União para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), para que já seja incorporada ao projeto de lei orçamentário do ano que vem”, destacou o consultor de Orçamento do Senado Daniel Couri, em entrevista ao Blog. “De toda forma, se o Congresso tem se manifestado favorável ao andamento acelerado dessas propostas, o que mitiga o risco de que alguma dessas medidas não seja aprovada até o fim do ano”, acrescentou Couri, ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI).
Procurada, a assessoria do Ministério da Fazenda não deu previsão de quando isso poderá ocorrer. O texto da PEC está nas mãos do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e ainda não foi finalizado. A assessoria da SRI também não deu previsão de quando ele será concluído e enviado. Mas a expectativa é que isso ocorra ainda nesta segunda-feira (2/12), após a reunião do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Padilha e o ministro Haddad com os líderes do Congresso para finalizar o texto da PEC, na tarde de hoje. Só que, o encontro, previsto para começar às 16h30, está atrasado, e Haddad, que chegou no horário, acompanhado do secretário de Política Econômica da pasta, Guilherme Mello, mas precisou esperar um pouco até o término de outra reunião de Lula.
Na Bahia, o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, em evento na fábrica da montadora chinesa BYD, em Camaçari (BA), afirmou que a PEC que trata das medidas fiscais e “vai ser enviada hoje”. Amanhã, o presidente da Câmara tem reunião com o colégio de líderes na Residência Oficial para definição da agenda de votação. Se PEC for enviada com pedido de urgência, a matéria poderá cortar etapas e ser avaliada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, se aprovada, poderá ser encaminhada para o plenário diretamente, sem passar por comissão especial. Mas, para se incluída na Constituição, a PEC precisa de, pelo menos, três quintos de votos favoráveis da Câmara e do Senado, ou seja, 308 e 49 votos, respectivamente, em dois turnos.
Ao anunciar o pacote de corte de gastos, Haddad antecipou a divulgação da renúncia de receitas com o Imposto de Renda para quem ganha salário mensal de até R$ 5 mil, na contramão do ajuste fiscal, apesar de isso estar sendo programado para valer a partir de 2026. Essa medida causou desconfiança no mercado e fez o dólar disparar, na semana passada, e romper a barreira dos R$ 6 pela primeira vez no Plano Real.
Na sexta-feira (29/12), a divisa norte-americana chegou a ser negociada a R$ 6,114 para a venda e só deu uma recuada depois de os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), darem declarações de que vão dar prioridade para o ajuste fiscal e deixar a reforma do Imposto de Renda para depois, e recuou para R$ 6,001 no fechamento da semana passada.
A moeda norte-americana segue em alta no pregão de hoje, cotada a pouco mais de 1%, cotada a R$ 6,064 para venda, prestes a bater novo recorde, enquanto a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) opera no vermelho, pouco acima de 125 mil pontos.
Impacto duvidoso
Pelos cálculos de economistas, o impacto previsto das medidas do pacote anunciado por Haddad será menor do que o previsto, variando entre R$ 40 bilhões a pouco mais de R$ 50 bilhões entre 2025 e 2026.
Enquanto isso, parlamentares da Câmara dos Deputados se adiantaram e já protocolaram na Casa uma PEC mais ampla do que a proposta de Haddad. Assinada pelos deputados Kim Kataguiri (União-SP), Júlio Lopes (PP-RJ) e Pedro Paulo (PSD-RJ), a PEC tem como objetivo promover uma “ampla revisão de regras que condicionam o crescimento das despesas públicas federais”, prevendo um impacto fiscal de R$ 69,4 bilhões, em 2026 e de R$ 1,125 bilhão no acumulado até 2031. Entre as propostas incluídas nessa PEC estão a desindexação das despesas públicas em relação ao salário mínimo e a desvinculação de despesas da Saúde e da Educação ao comportamento das receitas. Além disso, a proposta também prevê a revisão de gastos tributários, supersalários, abono salarial e previdência dos militares – com a fixação da idade mínima de 55 anos para a aposentadoria integral de benefícios, que também estão entre as promessas do pacote de Haddad.
O maior impacto fica por conta da desindexação de despesas da Previdência e do BPC, de R$ 486 bilhões. Em segundo, a desvinculação dos pisos de Saúde e de Educação e a complementação do Fundeb está estimado em R$ 323 bilhões pelos parlamentares.
De acordo com o texto da PEC dos deputados da oposição, o efeito da indexação, de fato, “é o agravamento do desequilíbrio das contas públicas, o que se torna ainda mais crítico em um cenário de transição demográfica, como ocorre no Brasil atual”. Ela cita dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que a proporção de idosos na população brasileira já saltou de 8,7% (15,2 milhões), em 2000, para 15,6% (33 milhões) em 2023. “Em 2070, essa proporção deverá alcançar 37,8% (75,3 milhões) dos habitantes do País, o que certamente impactará os benefícios previdenciários e assistenciais”, informou o documento.