Por Luiz Recena Grassi*
Os yankees venceram e o belicoso holandês Mark Rutte garantiu o emprego por mais algum tempo. A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) teve sua mais importante reunião desde que foi criada, no início da guerra fria. Logo após ter acabado a Segunda Guerra Mundial, quando o mundo se dividiu em duas áreas de influência dos dois vencedores, de fato, do conflito armado: Estados Unidos e União Soviética.
Era para ser desativada com o fim da URSS, coisa que não aconteceu, porque o governo norte-americano passou a perna no governo russo. Com um estridente apoio de vários países da Europa, não só manteve a aliança como consolidou sua imensa estrutura burocrática e derramou verbas pesadas em forma de armamento.
Com o passar do tempo a estrutura burocrática e militar produziu pouco e as armas foram ficando fora de moda, obsoletas. Momento de decisão: modernizar o equipamento bélico. Aplausos. Então o rato perguntou: quem pede dinheiro novo ao gato? A reunião acabou sem novo aporte felino. Só um conselho: aumente-se a contribuição dos roedores. Um aumento de 2% para 5% do Produto Interno Bruto (PIB) de cada país a ser aplicado na Defesa regional europeia.
E começaram as negociações internas. O puxa-estica dos prazos e percentuais foi cruel e tumultuado. Os pobres e médios recusaram os 5%. Os melhores de vida prometeram apoio. Há muitas diferenças sob a aparente unidade. Faltava combinar o prazo. Veio a solução em forma de 10 anos e dividiu-se a contribuição: 3,5% para armas e equipamentos e 1,5% para projetos especiais. Aplausos novos.
E do alto do bolo saiu um Donald Trump feliz, impávido, colossal para si próprio e para o menino Mark, a pular de alegria por ter agradado em cheio o padrinho americano. Para completar, um conselho do yankee poderoso: não esqueçam de gastar as novas verbas com encomendas para a indústria americana, que é melhor e está em pleno funcionamento. Um final feliz como um jantar na casa real. Uma única sombra destoou, falando espanhol.
Pedro Sanchez avisou que mais de 2,1% a Espanha não pagará. Falou alto e ficou só, mas há um bom número de silenciosos que não garantem o sucesso total do novo e histórico acordo. Na Rússia, o governo comentou o tamanho da verba e da propaganda da decisão. O dinheiro é pouco e o barulho é muito, apresentando a Rússia como cada vez mais diabólica e infernal.
Agora é verão. Ao menos dois meses de aparente calmaria. Na Rússia, as Noites Brancas de São Petersburgo encantarão novamente russos e turistas. Só nos Fronts haverá ruídos. A Rússia ataca em vários pontos ao mesmo tempo.
A Ucrânia enlouquece com seu cobertor cada vez mais curto, a não dar conta de defender-se com eficiência em todos os lugares. Falta tudo e falta gente. Os palpiteiros de ocasião plantam: a Rússia prepara grande ofensiva para breve e contará com mais tropas da Coréia do Norte a apoiar seus movimentos. Sul-coreanos e ucranianos espalharam a notícia. O Kremlin nada diz. Se for verdade a situação ficará ainda mais complicada.
O CORREIO SABE PORQUE VIU.
Estava lá. O verão na Rússia é pequeno, mas intenso. Curto se comparado com o nosso. Dois meses, para eles, é bom tempo. Há situações notáveis: qualquer quiosque de sorvete de creme, sempre de creme, tem filas intermináveis. Os de água fresca ou refrigerantes também. Nem falar em poucos bares com jardim ou mesas ao ar livre. Imbatível eram as Noites Brancas de Leningrado, hoje São Petersburgo. Ali, por obra de um fenômeno natural, o dia não anoitece. Máximo chega a um dourado frágil que sobra do pôr do Sol. Fica assim uma, duas, talvez três horas e recomeça a clarear. A meninada aproveitava e fazia grandes festivais de música, rock de preferência.
A viagem de trem Moscou-Peter gastava sete ou oito horas nessa noite-dia. E chegava ao belo destino em hora normal de um amanhecer. O trem tinha cabines de quatro ou dois passageiros. As primeiras para famílias ou indivíduos isolados; as segundas para um passeio mais romântico, mesmo com beliches separados. Servia-se um chá ao partir e, depois, cabines fechadas não permitiam qualquer perturbação.
Consta que os amantes aproveitavam o balanço do trem para prolongar suas forças e esforços. Os russos riam, diziam que era imaginação de turistas. Fica a dúvida para uma próxima. E a lembrança de uma viagem louca: embarque de volta às 22h, com dia claro. Em movimento às 23h, dia cinza frágil. Uma da manhã e tudo voltava, renascia. Três horas e o sol estava ali, na janela. Para dormir um pouco só com cortinas. Em Moscou, o trem desembarcava sonâmbulos: só queriam chegar em casa e reencontrar sua cama.
*O jornalista foi, por muitos anos, correspondente do Correio Braziliense em Moscou