ARTIGO: Guizos invisíveis ainda produzem ruídos?

É tempo de paz, informa Trump, que desenha um novo cenário para si e para o conflito armado. Quer continuar seu apoio, mas não quer gastar mais

Donald Trump faz pronunciamento no Salão Oval da Casa Branca //Crédito: Saul Loeb/AFP

Por Luiz Recena Grassi*

Está a esgotar-se o prazo que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, concedeu aos países europeus para que ponham guizos ao pescoço do gato russo. É um felino que comeu o queijo da Ucrânia e, há mais de três anos, segura uma guerra sozinho, a enfrentar bloqueios econômicos de toda União Europeia, com ajuda militar dos EUA.

É tempo de paz, informa Trump, que desenha um novo cenário para si e para o conflito armado. Quer continuar seu apoio, mas não quer gastar mais. Tudo que sair de seus paióis, agora, será financiado e pago pelos países europeus via a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Em linha direta nada. Já informou, por exemplo, que os países bálticos não ganharão mais armas ou outros brinquedos mortíferos a partir deste início de setembro.

Na lista dos 26 apoiadores de agora, europeus, somados a Austrália, Nova Zelândia, Canadá e Japão, poucos ainda recebem armas diretamente. Para os europeus o recado de Trump é claro: armamentos só via Otan, que se transforma em nova agência armamentista formal, com juros e tudo o que mais implica em transações do tipo.

A França reclama nos cantos, mas mantém seu discursinho de apoio até a morte aos ucranianos; a Inglaterra diz que pode mandar soldados; uma falácia que ainda precisará do apoio do Parlamento, um obstáculo para quem tem maioria frágil, condição atual de Keir Starmer; a Alemanha subiu no muro e não quer descer tão cedo, seu negócio é reforçar o próprio exército e capacitar a indústria defensiva para melhorar o cacife nas mesas de negociação.

Os outros países contam pouco ou nada. Trump mandou o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky convencer seus aliados a não negociarem mais petróleo com os russos. Parada difícil e até agora sem resultados concretos. Houve alguma redução, sim, mas em 2024 os gastos chegaram a US$ 1.29 bilhões. Os aliados estimam ou esperam números menores para este ano.

Com aliados como esses, Trump prefere ir beber água na fonte: liga para o presidente russo Vladimir Putin toda hora. O Kremlin fechou a semana com duas ideias claras: conversar com Trump e marcar novo encontro. A segunda foi ler com clareza leis de guerra: soldados identificáveis, nos fronts ucranianos, são alvos no conflito armado, podem ser abatidos. Recado dado. Trump ganhou outras razões para seus movimentos táticos: acha que os EUA estariam perdendo a Índia, a Coreia do Norte e até a Rússia para a China.

Depois do desfile militar da semana, em comemoração à vitória na Segunda Guerra Mundial – parte do Pacífico, mostrou um pouco do que tem em armas modernas. O presidente da China, Xi Jinping, exibiu-se feliz com o palanque oficial, onde brilharam o indiano Modi e o russo Putin. Donald Trump botou o topete de molho em tinta laranja e prometeu renovar contatos. Assim, a reunião dos Países Dispostos, como a batizou Zelensky, pareceu um convescote em Paris. Sem trabalho ou decisões. Estas, poucas, são as que já foram apresentadas por Trump.

O grupo encerrou a reunião sendo taxado de confuso e ninguém produziu os guizos para controlar os gatos russos. Estes, também estão no verão deles, com resultados para apresentar, principalmente no setor da guerra, onde continuam a amealhar vitórias no campo de batalha.

O CORREIO SABE PORQUE VIU.

Estava lá. O Museu soviético Hermitage, em Leningrado (São Petersburgo), não tinha nenhuma obra de Rembrandt. O bilionário Hammer resolveu: comprou um quadro e fez a doação ao museu. O mestre está lá até hoje. Em 1986, a União Soviética não sabia bem o que fazer com as vítimas do acidente de Chernobyl.

O bilionário Hammer mandou dinheiro e um hospital de emergências para cuidar dos feridos. Muitos foram levados para outros países e lá receberam cuidados. Armand Hammer era um bilionário norte-americano, filho de russos e nascido em Nova York. O pai médico era comunista. Em 1921, recém formado em medicina e já dono de uma rede de farmácias, Hammer foi para a União Soviética, onde passou sete anos e fez vários negócios. Voltou para os EUA e nunca deixou seus contatos com os soviéticos.

Durante a Grande Depressão promoveu grandes exposições e leilões de artes em Nova York. Foi depositário e negociante da coleção de joias e obras dos Romanov, última família a dirigir o império russo. Isso deu-lhe fama, pois dinheiro ele tinha de negócios em vários segmentos, notadamente na exploração de petróleo e gás nos EUA e nos países árabes. Não teve apoio de Kennedy em seus projetos na URSS; mas ganhou toda a força no governo Lyndon B. Jonhson, quando estabeleceu uma extensa e variada rede de negócios e possibilidades de intercâmbio econômico entre os soviéticos e os norte-americanos. Morreu aos 90 anos em 1992, na Califórnia. É longa a folha de negócios dele com os soviéticos. É sempre citado como exemplo pessoal das relações entre os dois países.

*O jornalista foi, por muitos anos, correspondente do Correio Braziliense em Moscou