Por Luiz Recena Grassi*
Começou junto com o ano o que poderá ser o início de negociações de paz entre Rússia e Ucrânia, que completa três anos no mês que vem. O balanço da guerra não traz muita coisa nova. A Rússia segue apertando o torniquete e ganhando novos territórios da Ucrânia. Os que podem decidir ou exercer alguma influência esfregam as mãos na expectativa de bons acordos e algum negócio, notadamente aqueles relacionados com a reconstrução da região. Donald Trump ainda não assumiu a presidência dos Estados Unidos, mas já sinalizou que irá reduzir, e muito, o apoio bélico-financeiro a Kiev, União Europeia (UE), Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), e também o respaldo político aos países da UE.
Loyd Austin, secretário norte-americano de Defesa, presidiu no meio da semana, a 25ª e última reunião de Ramstein, uma base dos EUA na Alemanha. O grupo foi inventado por ele mesmo, assim que estourou o conflito entre os dois países. Vai acabar agora. Austin garantiu um apoio que ele não tem para dar. Então, para não ficar mal, anunciou um cheque de U$ 500 milhões para Volodymyr Zelensky se defender um pouco. Garantiu que vai trabalhar para que Trump mantenha o apoio. Difícil. Passou para a Polônia o comando de base militar atualmente gerida pela Otan.
Jogo de cena: a base não é tão importante e pode mudar de rumo quando os yankees assim o quiserem. Otan e UE podem ficar e perder uma influência já debilitada. Os países europeus fortes já não querem investir ou assumir mais obrigações com a Ucrânia além das que têm hoje. E o espectro eleitoral paira sobre muitos. Migrações, desemprego e outros problemas econômicos enfraquecem o quadro geral. Do outro lado da mesa, Moscou informa novas conquistas bélicas, como a cidade de Kurakhovo, importante entroncamento viário e central de produção na região Donbass-Donetsk. E não perdeu o mote sobre a questão Trump e a tomada da Groenlândia. Garantiu ser enorme o interesse da Rússia no Ártico e lembrou das duas dezenas de bases instaladas no vasto continente gelado. Disse que pode negociar uma exploração com outros parceiros. E aproveitou para garantir que está disponível para essas e outras conversas. Que cheguem a um acordo. E deixem Zelensky de lado.
Ainda longe, mas chegando perto, cheio de fichas nos bolsos tem Donald Trump. É um player poderoso e está sendo aguardado pelos demais. As cartas começam a ser distribuídas, mas o jogo vem sendo jogado há mais tempo. Todos querem chegar fortes à espera da paz.
O CORREIO SABE PORQUE VIU.
Estava lá. Como conseguiu enfrentar quatro invernos em Moscou e depois reclamar de tempos mais cálidos em outras cidades frias? E agora, José? Correspondente não é contorcionista. A explicação, porém, requer detalhes difíceis, narrativas delicadas. Primeiro a calefação sem falhas, aliada vital; depois o “homem cebola”, que adiciona camadas de roupa a cada queda do termômetro. O transporte público, organizado e eficiente entra na receita com louvor. Vodka e calor humano fecham o pacote.
Histórias emolduram. O streap tease ao chegar no trabalho e “descascar” a cebola até ficar com calor. Casacos pesados na entrada; os mais leves nos cabides da sala e por fim as camisas, no espaldar das cadeiras de trabalho. No primeiro dia decidi não fumar mais. Eles fumavam nas escadarias, separadas por portas pesadas que garantiam o calor de dentro, não ia além disso. Não achei boa ideia virar sorvete de tabaco… Pior sorte teve um deputado nordestino. Cabra macho, enfrentou graus negativos e subiu dois andares pela escada, com pouca roupa, atrás de uma dadivosa bolchevique. Tudo resolvido, não sabia usar o elevador para voltar. Cabra macho, viu a porta entreaberta, desceu um lance, a porta fechou. No outro, a porta pesada já estava fechada. Camiseta e cueca não ajudaram. Salvou-o um segurança que não dormia e viu o circuito interno de tevê. Diplomacia sexual em campo, boletim interno para isentar o hotel em eventual caso de gripe parlamentar.
Para arrematar a história, ele usa o sorvete de creme, vendido nas ruas, para espanto e prazer de visitantes tropicais. “O melhor do mundo”, dizia o correspondente para seus filhotes, que lembram e riem até hoje. Era o único sabor. Marcou: um deles ligou no ano novo, desde Nova York, sob neve, para fazer a pergunta que abre o relato. O resto são risos e sorvete de creme. O melhor do mundo…
*O jornalista foi, por muitos anos, correspondente do Correio Braziliense em Moscou