“Ainda não dá para pensar em grandes voos”, diz Bacha

Um dos pais do Plano Real, o economista e escritor Edmar Bacha, faz balanço dos 30 anos da moeda brasileira e alerta que o país continua preso na armadilha da renda média baixa.

Ao fazer um balanço sobre os 30 anos do Plano Real, o economista e escritor Edmar Bacha, um dos pais do projeto da atual moeda brasileira, não tem dúvidas de que o plano foi bem-sucedido no controle da hiperinflação, que chegou perto de 3.000% ao ano. Contudo, ele afirma que não é possível ser otimista com o Brasil, pois a Belíndia — termo criado por ele para definir o Brasil como uma junção da Bélgica, um país pequeno e rico, com a Índia, um país grande e pobre –, ainda está presente e o país não conseguiu sair da armadilha da renda média baixa. Com isso, segundo ele, ainda “não da para pensar em grandes voos”.

Durante a entrevista, por telefone, contudo, o dono da cadeira número 40 da Academia Brasileira de Letras (ABL), faz ressalvas em relação ao desempenho da economia atualmente e, para ele, ainda não é possível ser otimista com o Brasil”. “Acho que a gente tem que jogar na defesa e impedir que os ganhos que a gente obteve até agora sejam destruídos, seja em termos de estabilidade, seja de equilíbrio fiscal, seja controle do desmatamento. Enfim, com crescimento de 2% a 3% no Produto Interno Bruto (PIB), e manter esse ritmo. Mas não dá pra pensar em grandes voos”, afirma.

“O Plano Real foi bem-sucedido no propósito básico dele”, afirma Bacha, entrevista publicada na edição desta segunda-feira (24/6), do Correio Braziliense, com os principais trechos da conversa. Agora, destacamos alguns trechos da entrevista que não foram publicados.

O economista também defende uma maior abertura da economia para que o país consiga sair da armadilha da renda média. “E fora disso, tem a reforma do Estado. Nós temos um Estado balofo, que leva um terço de tudo que o país produz e não devolve os serviços que dele se espera”, frisa.

De acordo com Bacha, essa dicotomia Lula-Bolsonaro é péssima. “Temos que dar um jeito de encontrar um caminho do meio. Sabe-se lá como. Mas fora isso, acho que tem que Belíndia está aí. Não dá para pensar no país desenvolvido com essa discussão de renda que a gente tem. Tem que ter um sistema de transferência de renda muito mais eficaz”, defende.

Com uma das saídas nesse sentido, ele defende a proposta do (ex-senador) Tasso Jereissati (PSDB-CE), para a criação da Lei de Responsabilidade Social, que previa a unificação desse sistema de transferência de renda, e também fazer mecanismos mais eficazes para a proteção do pessoal do que está no setor informal, que não tem proteção nenhuma.  Outra proposta é a reforma do Estado. “Nós temos um Estado balofo, que leva um terço de tudo que o país produz e não devolve os serviços que dele se espera. E é preciso abrir a economia, porque todo país que cresceu estava com a economia aberta e integrada do mundo, até a China. Do tamanhão que é, só cresceu a partir de 1982, quando abriu a economia”, reforça. 

Na avaliação do economista, houve muito aprendizado ao longo dos planos fracassados para a criação do Plano Real, e, essa experiência, por exemplo, ajudou países como o Chile a combater a inflação da forma certa. “Muita coisa a gente tinha que fazer. Eu me lembro que o Alejandro Foxley foi o primeiro ministro da Fazenda (entre 1990 e 1994) após a redemocratização no Chile, em 1988. O Foxley, que é meu amigo, brincou pra mim, e disse: Bacha, obrigado por vocês e os argentinos, terem vindo antes de nós e mostrarem tudo errado que era pra não ser feito”, conta o economista.

Bacha lembra também que a Argentina também, quando redemocratizou, implantou o Plano Alfonsin, “que foi um enorme fracasso”. “O Chile, não. Foxley entrou com o Banco Central independente, desde o começo, e eles fizeram tudo direitinho. Mas eles não tinham tanta inflação assim”, emenda.