Ajuste fiscal necessário chega a 4% do PIB, estima Itaú Unibanco

Pelas projeções do Itaú Unibanco, nas condições atuais, será preciso um ajuste de 4% do PIB, o equivalente a R$ 508 bilhões, para que a dívida pública bruta se estabilize em 80% do PIB -- o que não garante a volta do grau de investimento

A poucos dias do envio do Orçamento de 2026 ao Congresso Nacional, que deverá ocorrer na sexta-feira, o Itaú Unibanco fez um alerta sobre a piora do quadro fiscal, com a dívida pública bruta ultrapassando 80% do Produto Interno Bruto (PIB) a partir de 2026. Pelas projeções da instituição, será preciso um ajuste de 4% do PIB, ou seja, R$ 508 bilhões, considerando a previsão do Ministério da Fazenda para o PIB nominal deste ano, de R$ 12,7 trilhões, para o governo estabilizar a dívida em 80% do PIB – e, mesmo assim não haverá garantia de o país recuperar o selo de bom pagador perdido em 2015. 

“Olhando para o equilíbrio fiscal, tem muita gente que esquece, mas a situação fiscal continua muito difícil, muito desafiadora”, afirmou o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, nesta quarta-feira (27/8), em entrevista aos jornalistas sobre a atual conjuntura macroeconômica.  

O ex-diretor do Banco Central ressaltou que o desequilíbrio das contas públicas é um dos motivos para o BC continuar mantendo os juros básicos elevados por um período “bastante prolongado” como tem sinalizado nos comunicados recentes.  “O governo tem que fazer um ajuste fiscal intenso para estabilizar a dívida. Só que, se a dívida for estabilizada entre 80% do PIB e 85% do PIB, será muito difícil pensar num futuro em que o Brasil volta a ser grau de investimento e consegue reduzir o custo de capital. Com essa dívida alta, o país vai continuar premiando o rentismo e punindo o empreendedorismo”, alertou.

De acordo com Mesquita, esse cenário não é o mais plausível, mas é o atual, considerando as estimativas do banco que indicam aumento do rombo fiscal em 2026, que deverá ficar em torno de 1% do PIB enquanto a meta fiscal do próximo ano é de um superavit primário de 0,25% do PIB, ou seja, R$ 34,3 bilhões, conforme o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) do próximo ano e, provavelmente, do Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2026, que será enviado ao Congresso Nacional na próxima sexta-feira.  Vale lembrar que, em abril, técnicos do governo divulgaram o PLDO do próximo ano com um buraco de R$ 118 bilhões e ele ainda não está totalmente coberto.

“O cenário plausível de PIB crescendo 2% e juros reais de 6%, exigiria um superavit primário de 3,2% (do PIB). Como agora (as contas) estão rodando com deficit próximo a 1% do PIB, será necessário um ajuste fiscal da ordem de 4% do PIB”, explicou. “Esse é o desafio fiscal brasileiro. É o desafio que o governo, quem quer que seja e que esteja no governo vai ter que enfrentar, na nossa visão, vai precisar enfrentar em algum momento”, afirmou.

Pelas projeções do Itaú, a dívida pública bruta do país vai passar dos cerca de 72% do PIB, de 2022, para 85% do PIB, em 2026. Esse patamar está  acima da média dos países emergentes, de 70% do PIB, conforme dados do Fundo Monetário Internacional (FMI).  Ou seja, ao longo dos quatro anos do atual governo, a dívida pública vai crescer 13 pontos percentuais do PIB, algo bastante expressivo, mesmo com os limites do arcabouço fiscal. 

“O gasto público, em termos gerais, apesar do arcabouço projetar incluir um limite de 2,5% (para o crescimento nas despesas acima da inflação), na prática, ele (o gasto público) está crescendo um pouco acima disso, em torno de 3%”, disse. Segundo ele, as despesas que acabam ficando fora do cálculo da meta fiscal crescem acima do limite do arcabouço. 

Na avaliação de Mesquita, o próximo governo, seja qual for, precisará aproveitar o capital político de início de governo para fazer o máximo que puder, para recuperar a credibilidade.  E, nesse sentido, as diretrizes continuam sendo as mesmas, como a desvinculação do salário mínimo aos benefícios previdenciários e a revisão dos gastos tributários, que estão muito elevados, serão medidas temas inevitáveis, em vez de ajustes pela inflação mais elevada, que aumenta o PIB nominal e ajuda a reduzir a dívida pública em relação ao PIB. 

Mesquita reconheceu que, atualmente, está mais complicado fazer um ajuste fiscal grande, como há 10 anos ou a 15 anos, mas ainda “é possível ter ganho de credibilidade”. “Quando você começa na direção correta, ele ganha tempo que joga ao seu favor. Se você sempre que propõe uma regra fiscal crível e que gera a expectativa de que ela vai ser cumprida, sim, claramente você tem um ganho de credibilidade. Agora, se a gente pensar no fiscal, esse efeito de credibilidade vai se deteriorando um pouco ao longo do tempo. Se a pessoa promete que vai fazer uma dieta todo ano e no fim ela acaba engordando, da próxima vez que ela fizer promessa, não é tão crível assim”, explicou. 

Conforme as projeções do Itaú Unibanco, o PIB brasileiro deverá crescer 2,2%, neste ano, e o ritmo vai desacelerar para 1,5%, em 2026, mas com “viés de alta”. Esse cenário, segundo Mesquita, está relacionado com a política monetária do Banco Central, que está surtindo efeito e, por conta disso, a taxa básica da economia (Selic), atualmente em 15% ao ano, só deverá começar a cair no primeiro trimestre de 2026, se o Banco Central mantiver a sinalização dos comunicados. 

A taxa básica da economia (Selic), atualmente está em 15% ao ano, e, para o fim do próximo ano, a equipe do Itaú projeta os juros básicos encerrando dezembro a 12,75% anuais. “O Banco Central está começando a ganhar a batalha das expectativas, isso é muito bom”, afirmou.

Mesquita destacou também que o BC tem tido boas notícias derivadas da pesquisa Focus. Após 13 revisões para baixo, a mediana das estimativas do boletim semanal para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deste ano, recuou para 4,86%, nesta semana, se aproximando do teto da meta de inflação, de 4,50%. “A política monetária está começando a colher os frutos do esforço todo que foi feito. E, justamente agora, quando o BC está começando a ganhar o jogo, não faz sentido mudar a tatica”, afirmou. 

No entanto, pelas projeções do Itaú, a inflação oficial ainda encerrará acima de 5% (5,1%), e só convergindo para a margem de tolerância em 2026, quando o IPCA deverá acumular alta de 4,4%. Em relação aos impactos do tarifaço de 50% dos Estados Unidos sobre os produtos brasileiros, os economistas do banco consideram que a alíquota efetiva, considerando as isenções setoriais, ficará próxima a 30%, com impacto de US$ 12, bilhões nas exportações.