A glamourização da solidariedade

A tragédia no Rio Grande do Sul prova, mais uma vez, o nosso ímpeto para fazer o bem, mesmo quando não divulgamos

Joédson Alves/Agência Brasil08/05/2024 – Base aérea de Brasília recebe doações para os atingidos das chuvas no estado Rio Grande do Sul

O brasileiro é solidário por natureza. Ajudar o outro, custe o que custar, faz parte do nosso DNA. Quem tem pouco ajuda quem não tem nada. E quem não tem nada se endivida, se necessário, para ajudar também quem igualmente nada tem.

Isso não é de hoje. Nas tragédias, que bom, essa característica aflora. A vontade de fazer o bem vem à tona mesmo, sem esforço. É algo nosso. Todo mundo quer contribuir: pouco ou muito. São filas e mais filas que se formam país afora nesta semana para enviar ajuda ao povo do Rio Grande do Sul, tomado pela água.

O que me provoca algum incômodo nesta tragédia da vez é uma certa glamourização da solidariedade, o que representa uma antítese do conceito de solidariedade.

Entendo que numa sociedade quase 100% virtual, como a que estamos vivendo (e eu, particularmente, tenho dificuldade de me acostumar com isso), divulgar solidariedade pode incentivar mais solidariedade, criando uma corrente do bem, como dizemos geralmente. Ótimo.

Mas daí a fazer vídeo e foto com tom de autovalorização por estar ajudando os outros me parece, digamos, demais. Não quero ser “fiscal de solidariedade”. Longe disso. Que cada um seja livre para fazer o bem que entender e o que bem entender com o bem que faz.

Por que, então, faço esta anotação? Porque me parece que quem não está divulgando que está ajudando é como se não estivesse ajudando. É como se divulgar fosse mais importante do que ajudar em si. Não faz sentido — pelo menos não na vida real.